Apenas o começo.
A temporada de The Carrie Diaries
pode até ter sido curta, mas nessas 13 semanas, conseguiu provar seu valor e se
fortalecer (um pouco), frente a seu público alvo. Foi um começo ruim, se
levarmos em conta apenas os números, mas em termos de qualidade da produção, a
história é outra. Há sempre quem critique séries feitas para adolescentes.
Existe uma aura de preconceito nesse ramo, porque há a máxima de que se é feito
para os jovens deve ser vazio, idiota, fútil. Muitas vezes isso é verdade, mas
acredito que The Carrie Diaries consiga fugir do estereótipo e ser uma série
divertida e com um conteúdo bacana. Claro que o objetivo principal aqui é o
entretenimento e isso TCD proporcionou semanalmente, sem forçar a barra, sem
querer ser mais do que é.
O legal é notar que no meio da
diversão e das confusões amorosas de todos os personagens foi feito o registro
de uma época. Apesar de eu ainda achar que o figurino da série é extremamente
gentil com o estilo propagado na década de 1980, com raríssimas exceções em que
a breguice faz justiça ao período, a trilha sonora foi muito marcante e bem
escolhida, utilizada de forma inteligente, assim como a questão social, muito
focada na independência feminina e em alguns preconceitos que ainda existem,
mas que hoje já são tratados com menos pudor, pelo menos.
Também não podemos esquecer de
Carrie como referência a Sex and The City e lembrar que TCD foi feita com
cuidado no sentido de incluir quem nunca viu a “série mãe”, exibida pela HBO. A
história funcionou bem para todos, mas é claro que certos detalhes foram
colocados estrategicamente para quem já apreciava SATC e procurava um pouco
mais de material ou até matar as saudades. Ainda não conseguimos ver como Carrie
conheceu as amigas (isso deveria acontecer, seguindo o caminho do livro), mas
quem sabe? Talvez a CW renove a série e consigamos chegar lá.
Vale dizer que mesmo que não
passemos dessa Finale, a mensagem sobre quem é Carrie e como ela se torna a
mulher que muitos de nós já conhecíamos fica clara. Era uma época de mudanças
comportamentais e Carrie é influenciada por tudo isso, além de fazer parte do
processo que colocou a mulher, de uma vez por todas, no mercado de trabalho,
competindo e marcando presença fortemente. Antes disso havia a cultura do
casamento, disseminada por séculos. Se uma mulher não fosse casada estava
perdida e condenada. Parece dramático, mas é verdade. Embora ainda existam
resquícios desse pensamento (quem nunca ouviu esse tipo de insinuação de uma
pessoa mais velha?), a atitude vem se transformando, até pela necessidade
financeira. Carrie representa tudo isso, o que acaba pontuando a série como
feminista, mas nada exagerado ou panfletário. O modo como Carrie e as demais
mulheres da série encaram o mundo é extremamente positivo, levanta bons
questionamentos e não esquece ou deixa de lado os dramas pessoais e essa luta por
um relacionamento que “complete” o ciclo, afinal, não dá para escapar desse
espectro, que também faz parte da vida das “mulheres modernas”, para usar um
termo bem clichê.
Nesse Finale, isso tudo fica bem
evidente. Carrie está preparada para passar o verão na cidade e trabalhar em
tempo integral na revista, ao mesmo tempo em que não quer se afastar de
Sebastian e tem devaneios sobre uma vidinha de esposa e mãe nos subúrbios. Larissa
diz algo extremamente interessante: “Essa é a vida da sua mãe, não é o que você
quer.”. E quem já viu SATC não discordará que Carrie pertence em NY e á vida
atribulada e diferente, só que ela ainda trava essa batalha sobre o que ela
quer para si e o que os outros acham que ela deveria querer.
Mesmo dividida entre “amor e
trabalho”, se é que podemos colocar assim, Carrie sempre escolhe sua carreira
ou tenta se balancear entre as duas coisas. No fim, as atitudes inconsequentes
de Sebastian ajudam a firmar o rumo das coisas e, sem remorso, Carrie parte
para sua temporada em NY, ao lado de Walt. Aliás, é legal notar que os dois
estão se descobrindo. Ela como escritora e mulher, ele assumindo ser gay.
Gosto muito de Walt por diversos
motivos. Ele representa outra mudança de pensamento e suas atitudes e medos são
certeiros. Ainda hoje podemos ver meninos e meninas homossexuais enfrentando
problemas para assumir suas verdades diante da família e da sociedade. Não sou
ingênua a ponto de dizer que tudo mudou nesse sentido, mas creio que houve
alguma evolução e, assim como no caso da liberdade para mulheres, a liberdade
(de existir ou de se assumir) dos homossexuais vem evoluindo em pequenos
passos, apesar de a realidade (que envolve muita violência e ignorância) não
ser cor-de-rosa.
Só pelo que representam esses
dois personagens não entendo como há quem diga que TCD é uma série boba. É
preciso ver mais do que o figurino ou as musiquinhas e não encarar os diálogos
como bobagem de adolescente. Tudo está ali e o espectador tem que fazer essa
análise, embora os nascidos mais recentemente não dominem essa ambientação de
30 anos atrás. De qualquer forma, de um jeito leve, The Carrie Diaries mostra
tudo isso, o que é louvável.
Uma coisa curiosa desse episódio
está no momento em que Bennett rejeita as investidas de Walt por ele não ter 18
anos ainda. Fiquei surpresa, apesar de achar a atitude corretíssima. Se
compararmos o tratamento dado a essa mesma situação em outras séries teen, o
andamento seria muito diferente. A figura de Bennett, aliás, é bem marcante,
apesar da pequena participação. Ele é o cara que desmistifica o “sair do
armário”, tirando o dramalhão, sem esquecer que o processo não é fácil. A
dobradinha dele e Walt completa esse ciclo muito bem.
Num patamar mais leve, por assim
dizer, ficamos com as histórias de Dorrit (e sua primeira vez) e de Mouse, que
foi o alívio cômico perfeito para a temporada. Mesmo em momentos hilários, ela
também representa a mulher competitiva e que enfrenta a família para impor suas
vontades. Basta pegar o caso desse episódio, em que ela esquece as tradições
(adorei a descoberta de que ela era da “nobreza chinesa”) e esquece um pouco
dos estudos, para apresentar West para sua família, mesmo sob o risco de alguma
manifestação racista.
Maggie, por sua vez, continua
absolutamente perdida e é, talvez, a única personagem que evoluiu pouco, ou
melhor, que regride. Em muitos momentos da temporada ela ensaia uma virada, mas
diante das dificuldades, cai nos mesmos erros de sempre, usando isso como “muleta”.
Dessa vez, com Sebastian, ela acaba passando dos limites e não dá para dizer
que ela “não pensou”. Parece que ela se sabota para poder justificar todas as
frustrações.
Também foi bom ver como Tom foi
saindo do luto e encarando a vida de viúvo e de solteiro, cheio de medos e
dúvidas, mas sem deixar de arriscar e procurar a felicidade. Dorrit é a pessoa “madura”
que mostra para a irmã que esse processo é importante para o pai, que afinal,
tem filhas quase adultas e ficará sozinho em breve, o que mina o egoísmo de
Carrie totalmente e a faz pensar que seguir em frente não é um pecado.
Depois de tudo isso, espero que
The Carrie Diaries possa continuar. Parece justo que a história continue, já
que essa é, de longe, a melhor estreia da CW. Sabemos que a audiência não
responde proporcionalmente e que tudo se baseia em lucro, mas da nova safra de
séries para público jovem, essa é de longe a mais interessante e bem feita. Se
as coisas ficarem por isso mesmo, no entanto, não podemos reclamar. Essa Season
Finale fecha um ciclo de ideias e evoluções que transformaram a temporada num
experiência que não causa nenhum arrependimento.