As sete maravilhas do mundo na visão de um completo idiota.
Você que não faz ideia do que se trata "An Idiot Abroad" e clicou para ler mais porque achou que a frase de abertura era brincadeira deve, desde já, saber de uma coisa: Não é brincadeira.
Essa é a simples e genial premissa dessa série (ou seria documentário?) idealizada pela mente sagaz de Rick Gervais, ator e humorista britânico, mestre da sutil e delicada arte da trollagem.
Nesse projeto, ele se uniu a seu amigo Stephen Merchant com a única intenção de infernizar a vida de outro amigo: Karl Pilkington. Para quem não conhece nem mesmo Gervais (shame on you), basta dizer que os três trabalham juntos, gravando podcasts e no programa The Rick Gervais Show e têm uma dinâmica incrível, que consiste em Gervais e Merchant implicando, rindo ou se deliciando com as incontáveis pérolas de sabedoria proferidas pelo outro.
Pilkington é um cara simples e que odeia sair da rotina e de sua zona de conforto. Sempre diretamente honesto em suas opiniões, ele não é o tipo de pessoa que finge gostar de alguma coisa para agradar aos outros. Essa falta de filtro social faz dele um cara esquisito e hilário ao mesmo tempo. Uma espécie de pensador dos tempos modernos, que sequer tem noção das coisas incríveis que diz por aí.
Para se ter ideia da filosofia de Pilkington basta saber que ele se enxerga como uma espécie de “Branca de Neve”. Segundo ele, um homem não precisa de mais do que sete amigos para passar pela vida toda, sempre podendo contar com alguém. Igualzinho à Branca de Neve, que poderia viver “hapilly ever after” ao lado dos sete anões, sem nunca necessitar da ajuda do príncipe (exceto, talvez, para aquele lance da maçã envenenada).
Para nossa sorte, entre os anões de Pilkington estão Gervais e Merchant, que resolveram propagar pela televisão todo o potencial desse verdadeiro pensador. O resultado dessa trollagem televisiva é “An Idiot Abroad”, programa no qual Pilkington viaja apara conhecer as Sete Maravilhas do mundo e dar sua opinião sincera sobre os pontos turísticos mais valorizados.
São nove programas ao todo. Sete mostrando as aventuras de Pilkington, um explicando o conceito da série e outro com as considerações finais e algumas cenas não mostradas na edição. Os quarenta minutos de duração passam voando e você vai dar tanta risada que a vontade de rever as aventuras de Pilkington vai te pegar com força.
O mais engraçado é perceber que aquele jeito meio avoado e quase inocente não é atuação. Não existe no mundo ator capaz de fazer tão bem um idiota, ou diretor capaz de guiar tão bem um imbecil. Pilkington é aquilo que está na tela, por mais inacreditável que isso possa parecer.
Aqueles que ainda não viram essa delícia em forma de programa de TV precisam se permitir, porque viajar pelo mundo com Pilkington, mesmo à distância, é um a experiência inesquecível. Para se ter ideia, foi com ele que aprendi que na China, as pessoas têm Ipods, mas não tem papel higiênico. Aprendi também que a Grande Muralha deveria ser rebatizada para “The Alright Wall Of China”.
Aliás, a visita à Grande Muralha da China é a primeira da série e é possível dizer que não há, dentre os demais locais, um que Pilkington tenha odiado tanto. Ele passa ainda pela Índia, onde encontra bizarrices mil até se deparar com o Taj Mahal; Jordânia, passando por Israel, o local onde nasceu Jesus e Petra; México, onde luta telecatch e vai até Chichen Itza; Egito, para ver as pirâmides e andar longas horas de camelo; Brasil, numa visita bem carnavalesca ao Cristo Redentor e Peru, onde tem um gostinho da vida numa tribo indígena, culminando na longa caminhada até Machu Picchu.
Vale lembrar que as pirâmides não fazem parte das Novas Maravilhas do mundo, mas como o Coliseu, em Roma, parecia um destino confortável demais, Gervais e Merchant resolveram pela mudança e fizeram muito bem. Um dos melhores momentos é aquele em que Pilkington repete milhares de vezes que não viajará mais de camelo, num mimimi homérico.
São muitos momentos excelentes e memoráveis, porém o melhor episódio é mesmo o da Índia. Ri sem parar das divagações Pilkingtinianas. A visita ao Rio de Janeiro também rende muito, talvez, pelo fato de que sou brasileira e vê-lo estranhar ambientes tão comuns a todos nós, seja algo convidativo.
No entanto, minha identificação com Pilkington é imensa, em diversos sentidos. Para ele, o Cristo Redentor é apenas uma estátua gigante e eu não penso muito diferente disso. Além do mais, é impossível não gargalhar diante das reações dele a desfiles de carnaval, blocos de rua, sungas e praias de nudismo.
Não é a toa que “An Idiot Abroad” foi sucesso na Inglaterra, colocando o canal Sky1 entre os mais assistidos durante sua exibição, em 2010. Um fato curioso é que o nome do programa deveria ser “Karl Pilkington’s Seven Wonders”, mas todos concordaram que ele era um completo desconhecido e que o título final seria mais convidativo para o telespectador. Não há como discordar.
Para quem já viu, ou mesmo para aqueles que pretende assistir à série, a boa notícia é que estamos bem próximos da exibição da segunda temporada. Em setembro de 2011 a Sky1 lançará “An Idiot Abroad 2: The Bucket List”. Agora o desafio de Karl será cumprir uma lista de coisas que todos deveriam fazer antes de morrer. Se visitar simples pontos turísticos já rendeu horrores, mal posso esperar para conferir cada momento dessa nova malfadada aventura.
P.S.¹ As ligações telefônicas em que Gervais e Merchant passam instruções, dirigem, dão broncas e alopram Karl são um show à parte.
P.S² Não existem legendas em português, mas vale a pena assistir com as legendas em inglês, mesmo que você não entenda 100% do que dizem.
P.S³ Para curtir a empreitada completa, há ainda livro e podcast sobre a viagem.
**Agradecemos a quem conseguir encontrar Mexican Jumping Beans. **