Uma das coisas que fez de mim uma
fã de Fringe foi a percepção das referências. Não estou falando da simples
citação ou aparição de uma obra, imagem, música, livro ou personalidade. Estou
falando da referência na prática. Da arte de transformar uma história
pré-existente, já conhecida, para o universo da série. Esse episódio não é o
primeiro a fazer isso e na verdade o recurso faz parte das cartas na manga dos
roteiristas de Fringe. Não é fácil concretizar o trabalho dessas mentes
criativas. Não é fácil traduzir em imagens o que um texto sugere com muito mais
facilidade, especialmente quando estamos falando de temas complexos, pensados
para deixar a cabeça de todo mundo cheia de nós. Foi isso o que o episódio
dessa semana conseguiu concretizar, em um dos melhores roteiros já criados para
a série.
Como já havia citado na semana
anterior e como o título evidencia, esse episódio foi todo trabalhado com a
ideia do livro “Alice através do espelho e o que ela encontrou por lá”. A obra
foi publicada em 1871 e é impressionante como tantas décadas depois, pode ser
amplamente utilizada numa série de ficção científica. O livro traz uma série de
desafios estratégicos, baseados no jogo de xadrez. Daí vem a dualidade do
Universo de Bolso. Se no xadrez há o branco e o preto, em Fringe temos a junção
dos universos azul e vermelho, que criam esse lugar paradoxal, onde o tempo (ou
a percepção dele) corre de forma relativa ao do mundo real e onde as leis da
física não se aplicam da mesma maneira.
Foi assim, embora sem lidar com
cores para firmar o conceito, que Fringe montou o cenário desse episódio. O
jogo de luzes e as ilusões de ótica podiam confundir naquela espécie de
labirinto, que demandava talentos mais do que especiais para ser compreendido e
para encontrar a saída. O diferencial é que em Fringe essa experiência surreal
não acaba em sonho, como no livro. Aqui tudo parece ser muito real e necessário
para que o grande plano contra a dominação dos Observadores seja impedido.
Aliás, esse Universo de Bolso
serve como exemplo para explicar o que talvez seja o plano dos Observadores.
Pensar de maneira linear não vai ajudar a entender, porque em Fringe os
acontecimentos não são assim e aí é preciso roubar um pouco da definição de
tempo de Doctor Who para justificar o que estamos vendo. Nas palavras do Doutor: “From a
non-linear, non-subjective point of view, time is like a big ball of
wibbly-wobbly, timey-wimey.....stuff". Ou seja, de um ponto de vista não
linear e não subjetivo, o tempo é como uma grande bola de coisas wibbly-wobbly
timey-wimey”. Acho que assim fica fácil entender. Ou não.
Pensando exatamente como o Doutor
pensaria, estamos testemunhando o momento exato da história em que os
Observadores roubam o mundo para si. Como eles têm o poder de se mover na linha
temporal (mais uma vez, de modo não linear), estiveram presentes em momentos
importantes da história da humanidade, e é aí que fica claro.
Lembram de September e seus
colegas aparecendo em cada caso da Fringe Division? Não caçamos Observadores à
toa. A aparição deles sempre onde estavam Peter, Walter e Olivia seria muito
aleatória se exatamente esses três não estivessem ligados a algo muito maior.
Esse algo maior é, provavelmente, a criação e evolução dos Observadores. Por
isso a teoria de que Peter é o primeiro deles fica ainda mais forte depois
desse episódio.
Mas aí vocês podem perguntar: Mas
os Observadores não queriam Peter morto ainda na infância? Não deveriam então
ter desaparecido quando Peter desapareceu, se essa é a origem deles? A resposta
está nos paradoxos e na manipulação. Quem garante que tudo o que aconteceu não
foi calculado? Que cada passo da Fringe Division e do próprio September não
foram manipulados para que os resultados fossem exatamente os que vemos hoje,
porque essa é a combinação certa de fatores para o plano dos Observadores? Talvez
Fringe seja mais simples que isso, mas estou achando difícil de acreditar.
Um dos fatores que leva a essa
conclusão é a aparição do menino Observador (finalmente confirmado como um).
Obviamente não é mesmo ator, mas o carequinha vem para representar a ligação
com Inner Child (1x15), episódio em que a Fringe Division encontra o garoto
vivendo num local lacrado, sem comida ou condições respiratória. Sendo ele um
mini-Observadores, isso se explica, afinal, quanto pior a qualidade do ar,
melhor para eles (tanto que havia um “poluidor” no quarto do Universo de Bolso).
O engraçado é que esse episódio é
sempre um dos mais lembrados pelos fãs, que inventam teorias de que o menino é
September, assim como insistem que Peter é September. Não acredito em nenhuma
dessas possibilidades, porque apesar de todos os paradoxos de Fringe, a mesma
pessoa encontrando a si mesma mais nova ou mais velha, nunca foi sequer uma
possibilidade citada. Além disso, Peter teria de ser geneticamente modificado para
se parecer com September, algo como os shapeshifters. Duvido que façam essa
salada tão sem sentido.
E o que Walter encontrou por lá,
já que esse é o título do episódio? Certamente ele não viu o pequeno Observador
esperando no quarto, mas ganhamos o rádio, preso numa única frequência, dando a
certeza de que a qualquer momento ouviremos a mensagem que querem transmitir.
Além disso, havia Cecil e Walter encontra nele a noção de que sua humanidade
fica abalada com seu cérebro inteiro. O diálogo em que ele tem esse insight é
extremamente interessante porque ocorre no momento em que Peter passa pela
mesma circunstância, sem se importar, mas surpreso com suas novas habilidades.
De fato, Peter está numa metamorfose.
Sua humanidade talvez se perca totalmente e seu objetivo de vingar a morte de
Etta pode entrar pelo mesmo caminho. Por outro lado, Walter menciona que eles
precisam de um telepata para completar o plano, tanto é que o menino Observador
estava escondido no Universo de Bolso com essa função, que pode ser facilmente
preenchida por Peter, agora que ele se move, prevê o futuro e enxerga como um
Observador.
Muita gente, aliás, crê que a
cena de luta e da visão azulada seja referência a Matrix. Não vou discordar,
mas não é nada absolutamente claro também. Acho que há alguma similaridade, mas
não na íntegra. Outra coisa legal é o paralelo do Peter do começo do episódio
com o Peter do final do episódio. Joshua Jackson está dominando a arte de
passar emoção com olhar e deve ter aprendido muito com John Noble, mestre no
assunto. Estou realmente impressionada com a atuação do moço e em como o
personagem dele ganhou importância nessa reta final. Olivia, no entanto, parece
estar mais apagadinha.
Vi por aí um montão de gente
dizendo que Fringe cometeu um erro de roteiro com a temporalidade do Universo
de Bolso, mas discordo completamente. Num lugar onde revolveres não atiram e
onde dois mais dois não somam quatro tudo é possível. Tempo é relativo e isso
quer dizer que tempo é diretamente ligado à percepção. Às vezes um minuto pode
parecer uma hora e cito como exemplo aqueles cinco minutinhos de sono extra na
sua manhã. O lance ali, com Cecil, não era que o tempo passava de forma lenta,
mas sim que essa foi a forma como ele percebeu. Vinte anos viraram cinco dias e
ele sequer envelheceu. Por isso não estranho que Peter, Walter e Olivia não
tenham saído dali, sei lá, vinte dias depois (que seria o correspondente pelo
tempo que passaram ali dentro se aquele lugar diminuísse o passar das horas). A
percepção deles era de “tempo real” por assim dizer.
Também vale citar todos os
símbolos de Fringe nas portas: sapo, mão, cavalo marinho, maçã. Um toque bacana
para esse lugar fantástico que visitamos. E não, os símbolos não querem dizer
nada, por que os Glyph Codes só têm valor de alfabeto quando acompanhados dos
pontinhos amarelos que identificam cada letra.
A palavra dessa semana é SPLIT,
que significa dividir, separar, fenda, cisão. Parece relacionada justamente a
Peter e em como ele está mudando rapidamente. Como se ele não fosse mais parte
da raça humana, uma criatura separada de sua espécie de origem. Engraçado
lembrar que Windmark quase sorri quando nota o que está acontecendo diante de
seus olhos. Aquela expressão satisfeita é como uma confirmação de que tudo está
saindo exatamente como ele deseja.
P.S* Não queria usar outra imagem de Peter ilustrando a review, mas a simbologia da imagem é forte demais para ser ignorada.
Notei tbm Camis, Windmark sorri mesmo, achei bizarro rsrsrsrsrs.
ResponderExcluirA simbologia da imagem é forte DEMAIS! Até eu (que quase nunca percebo), reparei bem o significado da cena bem focada do episódio!
ResponderExcluirWow Camis,
ResponderExcluircomo sempre você escreve magistralmente. Acho que você não está viajando tanto assim não, na teoria de que os Observadores queriam que Peter fosse o primeiro, mas apesar de ter sentido acho que não será assim.
Você poderia ter citado que os pocket-universe são um conceito científico atual, e que Escher em seus desenhos, criou estas realidades com constantes físicas alteradas, bem como vimos no episódio.
Você ainda não disse em nenhum review, mas após a morte de Etta, e o florescer do Dark-Observador-Peter, a série aponta para um final ao estilo de tragédia greco-romana. Creio que haverão muitos sacrifícios ainda pela frente, e acho altamente improvável que Astrid e Boyles cheguem vivos até o último episódio da série. Quem sabe no final os Bishops não façam um derradeiro sacrifício em prol da humanidade, Peter já iniciou a sua imolação.
A referência ao menino observador da primeira temporada, mostra que os roteiristas tem a estória bem amarrada desde o início.
Juntando o que se tem será que alguém pode deslumbrar o que seria esta arma?
Temos até agora:
-O Plano cheio de formulas científicas indecifráveis.
-A Pedra vermelha
-O menino Observador
-O rádio sintonizado em uma frequência fixa.
Obrigado pela sua presteza em nos trazer uma review tão boa.
ResponderExcluirreview ótima e excelente episódio. Fringe continua surpreendendo fazendo uma temporada final impecável. eu embarquei nesse episódio de uma forma, foi uma experiencia inexplicável
ResponderExcluiragora só eu que me perdi ao cérebro do walter estar inteiro? eu realmente não lembro dele ter recuperado os pedaços. pelo que eu lembro os pedaços foram usados no season finale da primeira temporada pra descobrir como ir para o lado B. ou foi isso algo citado na 4ª temporada depois de terem acontecido as mudanças na timeline? realmente não lembro
muito bom camis!!!!
ResponderExcluirReview impecável, vejo que você é tão fã de fringe quanto eu, parabéns de coração!
ResponderExcluirEu gosto de ver o Peter versão sangue nos oi, mas tá me incomodando a Olívia sofredora mulherzinha. De tudo que foi criticado nessa quinta temporada, o que mais me incomoda é essa inversão de papeis. Olívia não precisa virar uma indefesa para o Peter ser um Dark ¬¬
ResponderExcluirAcho que Donald é o September sem tecnologia de observador, sei lá, ele de costas me lembrou.
ResponderExcluirWindmark é o observer criança e está P*** da vida pq o Walter deixou ele lá sozinho com uma barra de chocolate!
Super Concordo!!!
ResponderExcluirEpisódio show!!!! Fringe nesse epi me fez lembrar das temporadas passadas em que os acontecimentos giram em torno dos casos bizarros e etc... mas ao mesmo tempo nos levando a Inner Child (1X15) nunca esqueci desse epi! E, vou ter de concordar com o Marcos S. quando diz:
ResponderExcluir"Creio que haverão muitos sacrifícios ainda pela frente, e acho altamente improvável que Astrid e Broyles cheguem vivos até o último episódio da série. Quem sabe no final os Bishops não façam um derradeiro sacrifício em prol da humanidade, Peter já iniciou a sua imolação."
E o fato de Peter começar a desenvolver seus poderes de Observer, achei o máximo, mas ao mesmo tempo sinto que pode não vir boa coisa por aí, sei não...o que quero dizer é que, Peter pode se perder, se tornar frio tal qual esses carecas e (talvez, só talvez a única que pode trazer ele de volta seja Olivia) assim como ele fazia diferença na vida dela, (vide cortexiphan e super poderes sendo ativados e universos paralelos sendo atravessados)
E, sim mais uma vez destaque para ele Camis:
"Outra coisa legal é o paralelo do Peter do começo do episódio com o Peter do final do episódio. Joshua Jackson está dominando a arte de passar emoção com olhar e deve ter aprendido muito com John Noble, mestre no assunto. Estou realmente impressionada com a atuação do moço"
Ps: Windmark sorrindo.. bizarro! (como se pensasse, tudo está saindo conforme planejado)
E isso me leva seguinte pergunta: A onde Fringe vai nos levar???
Etta e simon recoloca os pedaços do cerebro de walter no 4x19
ResponderExcluiragora sim lembrei. obrigado :D
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